terça-feira, 30 de março de 2010

Bêbado? Quem? Eu?

Quando eu era pequeno, notei que a maioria das pessoas bêbadas não percebiam que estavam bêbadas. Isso me colocou uma pulga atrás da orelha e ainda criança ficava pensando: e quando eu estiver bêbado como vou saber que estou bêbado? Passei a infância com esse questionamento.

Não sei bem quando, talvez na adolescência, ou saindo dela que é somente quando começamos a receber resposta real para algo, alcancei uma solução satisfatória: observando as coisas ao meu redor.

Acredito hoje que fechar-se em próprias conclusões é falível... demais. Claro que precisamos tomar decisões individuais e assumir nossos riscos, mas não tomar o nosso habitat como referência é um suicídio.

Quando as coisas perto de mim começam a desmoronar sei que algo está bêbado, e muito possivelmente eu. Quando todos começam a apontar o meu zique-zague sei que devo estar zonzo. E assumo isso mesmo quando sinto ter razão. Não creio no acaso e se todos me vêem diferente do que me vejo não devo ser bem como imagino ou, no mínimo, não soube me expressar da forma que desejava.

Um homem se mede pelo fruto e não pelas palavras, discurso ou fé.

As palavras, discursos ou fé que não geram felicidade a si e aos mais próximos ao menos devem estar bêbadas.

Simples, bem simples e direto: ouço o delicado barulho das coisas e pessoas. Quando os copos começam a trincar, cair da mesa, as garrafas a secar e as pessoas não entendem mais o que digo, estou bêbado.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Entrevista n2 - Jr.Black

Junior Black é um grande homem - em todas as proporções que essa frase possa alcançar. Proprietário de talentos variáveis, é reconhecido por todos os que param um pouco ao seu lado como uma figura ímpar, um ser brotado da nossa mais criativa imaginação: algo entre o real e a fantasia. Cantor, compositor, contador de história, locutor, comediante, angustiado, artista; é de tudo um pouco e as vezes tudo em pouco.

Num final de tarde tranquilo, eu Black conversamos por 15 minutos logo após ensaio com sua banda para o lançamento do seu primeiro disco solo(RGB). Ao final da conversa nos demos conta que estávamos na Praça do Trabalho...(risos). Tudo a ver com a conversa a seguir:

Qual é seu ofício?

Cantor popular.

Por que você faz música?

Porque a música me tomou para si. Da primeira vez que eu entendi o que a música promovia nas pessoas, eu fui tomado por ela. Quando era pequeno, eu vi meus pais ouvindo discos de e dançando muito, vi as festas na casa da minha avó, e entendi, senti no coração que as pessoas ficavam mais felizes, mais alegres, mais elegantes com a música. Nesse momento eu decidi ser músico, ser cantor.
Acho que a música eleva a alma, te tira de um lugar, te põe em outro lugar. Mas tem que ter cuidado com o que canta, fala e diz, porque a música é um barco onde a gente deposita nossa alma lá dentro e ele vai para um oceano muito doido, muito extenso de coisa, situações, memória. Acho que a isso está acima de qualquer julgamento dos homens. A arte é superior a gente, e não no sentido angelical ou de Deus, mas no sentido fisiológico, humano.

Você acha que qualquer música é música?

A gente tem que dissociar entre o que é música e o que é arte. Música, pensando em compasso, tempo, ternário ou binário, harmonia e melodia é música.

Você acha que toda música é arte?

Sim. Agora partindo do princípio de arte de Percy. Acho que “arte” tem esse nome mas é só um casca, um invólucro, e esse significado é pessoal, intransferível e relativo. O que é arte para mim pode não ser para você ou para outras pessoas.

E o que é arte para você?

Para mim, a arte é quando promove no meu ser euforia, exaltação, sonho. Hoje eu faço música buscando a imagem do meu pai e da minha mãe dançando, eu pequenininho brechando meus pais levemente embriagados rindo em casa. Quando qualquer tipo de música me dá essa lembrança, esse ânimo de dançar, entrar no carro, viajar, curtir os amigos, ligar para alguém, acender um cigarro, eu acho que é arte.

Qual é a mensagem do seu mais novo trabalho, o disco RGB?

O que eu quis dizer nesse disco é que a gente não nasce para fazer uma coisa só. Nós somos um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete mil. Nós somos incontáveis pessoas dentro de um invólucro de carne, sangue e carbono. E que a gente vai continuar, nem que seja numa gravação, num filme, num espírito, numa reza. A gente vai continuar.

Esse disco surgiu num momento em que eu estava muito triste, com o fim de minha antiga banda, a Negroove, e eu tive vários medos. Mas depois fui percebendo que não precisava ter medo de nada, as coisas vão acontecendo naturalmente a medida que você vai se inclinando, se dedicando, vai se enxerindo, se inserindo. Como dizem os espanhóis, “o caminho se descobre andando”.

O que você buscava quando começou?

Com 12 anos eu ganhei meu primeiro violão. Eu tirava som no prédio e queria cantar para uma multidão de gente, 50 mil, 150 mil pessoas.

O que busca hoje?

Hoje eu saio do sonho e vou mais para a realidade. Tenho a expectativa comum a todo trabalhador, pois o fato de ser artista não me eleva a nenhuma condição especial de isenção de imposto ou de porra nenhuma. Tenho certa ambição saudável e o que eu espero é trabalhar bastante esse disco, encontrar condições no mundo para que esse disco se concretize em show, turnês e que se expanda por si próprio.

Você se sentiria um homem fracassado se?

Se depois desse tempo todo com música eu fosse obrigado a escolher outra profissão.

Você se sentiria um homem de sucesso se?

Se eu conseguisse, como ainda não consegui, já ter minha vida estável, equilibrada financeiramente.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Palavras vazias

Nesse fim de semana pensei bastante sobre palavras, na verdade, sobre palavras vazias.

Apesar de ser poeta, não acredito nas palavras como desenhos, nos discursos como caminhos de pura beleza estética. Eu acredito que as palavras representam - são extensões de sentimentos verdadeiros, de bolsões de energias pulsantes.

A força da palavra "cadeira", por exemplo, está em tudo que ela representa nos fatos, em momentos experimentados, e não em filosofias baratas perdidas no texto. Se a cadeira não servisse para sentar e se nela não pudéssemos sentar de verdade teríamos outra imagem e a palavra seria outra. A palavra "cadeira" tem a sua verdade no fato de servir para sentar e funcionar ao que se propõe, independente de qualquer abstracionismo. Uma cadeira que não serve para sentar nem o nome de cadeira carrega, e está mais para "monte de madeira entulhada"ou outra coisa criativa.

Muito me incomodam todos aqueles que usam das palavras sem correspondência com a realidade. Porque falar de bondade se eu não sou bondoso? Porque falar de espiritualismos se eu não acho como um espiritualista? Se eu nem o pratico ao menos? Porque falar de palavras que não servem na realidade ao que nos propomos? Porque falar de nossas cadeiras se não permitimos que nelas se sentem?

Não podemos, na minha opinião, nos medir pelos discursos. Precisamos nos medir pela vida: pelo que carregamos, pelos que nos carregam, pelos nossos exemplos e, o mais importante, pelos nossos frutos. É daí, senhores, que as nossas palavras surgem, é desse lugar que elas podem brotar.

Prefiro palavras que nos apontam as belezas, palavras que iniciam o encantamento e que não terminam em si. Prefiro os discursos que nos orgulham posteriormente. Prefiro as pessoas que primeiro consertam suas cadeiras para depois delas falar.

O dom de palavras vazias é um talento que não serve para nada. Talvez para nos inflar o ego e estourarmos como um balão sem medida. Esse talento senhores, eu dispenso.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Será que assim tá bom?

A verdade é que essa é minha primeira experiência com blog, textos para internet, atualizações. Meio perdido, ainda, mas cheio de vontade, seguindo o horizonte.

Optei aqui por textos curtos, mais diretos ao assunto - embora cheios de simbologia, indicações e poesia. Porque penso que a internet trabalha de forma rápida, dinâmica.

Decidi, até agora, pois depois me re-decido para outro lugar, organizar assim minha atualizações:

- Toda segunda um texto de minha autoria, falando da vida e tudo que a ela pertence e envolve. Falando da gente.

- Toda quarta uma entrevista ou texto de alguém. Um olhar externo de mim, outras opiniões, caminhos.

Será que assim tá bom?

Gostaria muito que vocês que me acompanham sugerissem, opinassem, elogiassem, cirticassem. Estou completamente aberto - aqui e na vida.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Entrevista n1 - Vitor Aaújo

Vitor Araújo é pianista, compositor, sensível e inconstante. Tem um talento incrível com os dedos, um bom gosto de algumas vidas e uma alma inquieta o suficiente para fazê-lo experimentar diversos pratos e repetir alguns. Precoce, começou cedo e continua cedo na vida.

Pergunta - Qual o seu ofício?

Vitor Araújo - O meu ofício é a arte.

P.- Arte é trabalho?

V.- Não, música é trabalho. Arte é inspiração só, aí a diferença. Mas na verdade se música é trabalho meu ofício seria ser músicoe não artista. É... não sei... paradoxal... acho que música é trabalho e arte não, mas ao mesmo tempo acho que meu ofício é arte.

P.- Ao começar a carreira você buscava...?

V.- Eu buscava saciar uma ansiedade, tocar para mim sempre foi uma ansiedade. Então era para saciar essa ansiedade de querer tocar.

P.- E hoje você busca...?

V.- Hoje eu busco mais ainda saciar ansiedades que vão se somando a ansiedade primeira.

P.- Você se sentiria um grande fracassado se...?

V.- Eu me sentiria um grande fracassado se no final da minha carreira eu não tivesse orgulho da minha obra.

P.- Você se sentiria um homem de sucesso se...?

V.- Se ao final da minha carreira as pessoas que eu admiro admirassem minha obra.

P.-Ah, naquele tempo...

V.- Ah naquele tempo que eu não sabia teoria musical e era livre pra criar sem saber que a subdominante vai pra dominante resolve na tônica.

P.- Se bem que hoje em dia...

V.- Se bem que hoje em dia eu posso improvisar a vontade, né? Se eu sei que harmonicamente qual é a tensão disponível e qual não é, eu posso estudar jazz com mais facilidade.

P.- Arte é pura habilidade, como conseguir fazer diversos pontinhos com a bola, fazer um armário bem rápido e encostar a língua no nariz. Não é?

V.- É. É (risos)...é.



segunda-feira, 15 de março de 2010

Onde vivem os monstros?

Mas enfim onde vivem os monstros? Onde se escondem os nossos maiores medos? Aqueles que nos travam os dentes, nos tremem as pernas, nos embrulham o estômago? Onde vive aquele desespero que evitamos com toda força? Aquele princípio de pânico?

- É um absurdo você fazer isso comigo, um absurdo.

De onde vêem, onde vivem, como chegam esse monstros terríveis que nos engolem, nos mastigam? Como chegam tão fácil a nós? Como podem apesar de todos os cuidados que tomamos?

- Que raiva, que ódio... acho que sou inocente demais para perceber a maldade das pessoas, por isso sou tão atacado e feito de bobo. São os outros, são as pessoas.

Onde aprenderam tanto sobre mim? Como conseguem ferir-me com essa precisão? Uma vida inteira tentando evitar, tentando se proteger, buscando proteção e ainda assim chegam tão rápidos, tão fáceis? Quem os ensina? Onde aprendem?

- Foi ele, ele sim. Ele fez a cabeça de todos, influenciou a todos, iludiu, enganou e fez com que todos ficassem contra mim. Só pode ser isso. Por isso tantos me acusam, esses monstros.

Onde vivems os monstros? Onde esses monstros vivem? Porque eles não me deixam em paz? Porque eles...?



Eles?

quinta-feira, 11 de março de 2010

Entrevistas

Decidi comecar uma série de entrevistas para postar aqui no blog.

Ja pensei em diversos nomes. Tentarei nao ser um jornalista, mas um curioso.

Gostaria bastante que com o tempo esse espaco, esse blog, pudesse agregar opinioes, valores e observacoes diferentes dos meus. Particularmente acho muito chato esse sistema "mono-vial" de me expressar sozinho.

Artistas, trabalhadores, observadores, anonimos ou qualquer um que se disponha a tanto estarao aptos a essa empreitada. O que importa é a disponibilidade de se expressar de forma inteira e verdadeira.

Pois bem, muito em breve publico a primeira. Até lá.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Para o alto e avante

Ontem (domingo) participei de uma mesa na livraria Saraiva Recife organizada pela ETC - Encontro dos Twiteiro Culturais, para discutir twitter, livros, literatura e a forma como toda essa tecnologia tem sido absorvida pela sociedade. Complexo, né? Nem tanto.

Acredito que nós adoramos a especulação. Sentimos prazer ao elaborar complicadas previsões catastróficas, caminhos tortuosos. A aproximação do perigo nos deixa acordados, presentes. No entanto a realidade parece ser mais natural e paulatinamente(como disse o poeta Abdias Campos também na mesa) as coisas tomam os próprios rumos, cada uma a seu tempo.

Um grande perigo nosso também é o apego nas pequenas formas. Quando surgiu o computador muitos passaram a questionar a morte da máquina de escrever. Uai, mas o computador com seu teclado não é uma continuação da máquina de escrever? Não é a sua evolução natural? Será que o computador não carrega em si a essência da máquina de escrever? O computador ainda é a máquina de escrever e agora é também o computador.

Será que o email vai acabar? O livro vai se extinguir?... e tantas outras perguntas. Ora, tudo vai evoluir e continuar existindo pela essência a que se destina. As novidades agregam tudo o que até ela existiu, porque assim elas foram criadas.

Essa discussão dá "pano pras mangas", em breve continuo ela aqui.


segunda-feira, 1 de março de 2010

Uma queda nem dói tanto

Na minha última aula de Aikido, o professor soltou essa bela frase:

- A gente precisa aprender a cair para evitar uma lesão.

Para o Aikido faz todo o sentido. E para a vida? Voltei para casa com o pensamento ocupado com a pergunta: e para a vida?

Para a vida faz mais sentido ainda. Aprender a cair é uma sabedoria. E de verdade, uma queda cuidadosa evita diversas lesões. Quantas pessoas já não presenciamos segurar com tanta força determinadas posições, mas com tanta força, que só a posição que segurava persistiu, todo o resto caiu. O orgulho muitas vezes nos sustenta de uma maneira suicida, provocando serias lesões. E não percebemos que certas coisas que ousamos defender só fazem sentido com todas as outras ao seu lado. Abaixar a cabeça muitas vezes nos salva de ter que deitar o corpo inteiro.

Quando pequeno aprendi uma lição importante em minha casa:

no prédio onde morava as garagens não eram marcadas, cada um estacionava onde bem entendesse. Um morador específico, no entanto, sempre conseguia a mesma vaga, e por anos estacionava ali. Um belo dia, minha mãe chega e encontra a vaga desocupada e lá para o carro da gente. Minutos depois atende um interfone desaforado e grosso do tal morador: venha imediatamente tirar o carro da minha vaga. Pois bem, minha mãe que não era (e não é) nada calma não tirou o carro nem por decreto federal. Ele por sua vez trancou a garagem impedindo a saída do carro. Todos os outros moradores se indignaram. O síndico tentou interver. Pessoas começaram a se reunir no pilotís tomando partido. Telefonemas. Interfones. Xingamentos. Meu irmão mais velho chamou uns amigos para tirar o carro dele no braço. E então, no meio da confusão, quando o vermelho já tomava conta de todos os rostos envolvidos, minha mãe parou na varanda, olhou para os céus, para as nuvens, respirou fundo, levantou, pegou o elevador, tocou a campainha, abaixou a cabeça e disse: perdoe-me a confusão, isso não vai se repetir. Vou tirar o carro agora mesmo.

E embora não fizesse ou conhecesse o Aikido, ela bem que poderia ter-me dito: meu filho, a gente precisa aprender a cair para evitar uma lesão.



ps- o morador também se desarmou com a atitude e pediu diversas desculpas. Passou a respeitar imensamente a minha mãe que acabou por conseguir coisa muito mais importante do que manter o orgulho e uma vaga.